quarta-feira, 24 de agosto de 2022

Pedro e Paulo, colunas de sustentação para um mesmo propósito

João Crispim Victorio[1]


        Simão, chamado de Pedro por Jesus, tinha um irmão mais novo chamado André, os dois eram filhos de Jonas (Mateus 16, 17). A cidade natal onde viviam era Betsaida, costa ocidental do Mar da Galileia, onde foram criados e formados pescadores. Simão e André passaram a infância e a juventude conhecendo as escrituras e as profecias a respeito da vinda do Messias. Contudo, não fizeram nenhum estudo aprofundado da lei, pois, eram pobres, consequentemente, não letrados (Atos 4, 13).
        Simão era um autêntico galileu. Tinha um carácter marcante de independência e possuía uma disposição de se colocar de maneira franca e transparente. Casou-se, conforme citado em (Mateus 8, 14; Marcos 1, 30; Lucas 4, 38). Falava um dialeto peculiar que o traiu por ter sido reconhecido como um dos seguidores de Cristo durante sua prisão e exposição diante do Conselho ((Mateus 26, 69-75) e expôs a sua nacionalidade quando se uniu a outros no dia de Pentecostes (Atos 2, 6-9).
        Saulo nasceu aproximadamente na mesma época que Jesus. Era natural de Tarso, capital da Cilícia. Província romana no sudeste da Ásia menor, à beira do Berdan, rio navegável que favoreceu a cidade a se tornar um grande centro comercial do Mediterrâneo. Tarso foi sede de uma universidade de alta reputação como as de Atenas e Alexandria. Por se tratar de uma região desenvolvida e, Saulo pertencer a uma família de classe média, ele viveu a infância e a juventude tendo acampamento educacionais. Isso, provavelmente, o facilitou ser enviado à escola judaica em Jerusalém, como estudante da lei. Passou, assim, por um elaborado estudo sobre as Escrituras e sobre questões com as quais os rabinos se ocupavam.
        Seu pai era fariseu[2], da tribo de Benjamim (Atos 23, 6; Filipenses 3, 5). Embora judeu obteve cidadania romana. Por esse motivo seu filho era livre e esse privilégio foi de grande utilidade para Paulo, no futuro. Já quanto a mãe de Pedro e a mãe de Paulo, nada foi dito a respeito, fato esse que só faz confirmar a narrativa patriarcal das escrituras. Mas há razões para pensarmos que elas foram mulheres que exerceram influências na formação do caráter de seus filhos.
Pedro e Paulo, junto com os outros apóstolos, espalharam a Boa Nova do Cristo no primeiro século. Todos foram pessoas bastante importantes no início do cristianismo. Foi por meio de suas viagens missionárias, que iniciaram várias igrejas no mundo conhecido. A vida e a obra deles estão registradas no livro dos Atos dos Apóstolos e nas cartas que escreveram para ajudar organizar e a manter a fé nas Comunidades que fundaram.
        Como vimos, Pedro e Paulo eram pessoas que pertenciam a classes sociais diferentes. Saulo, no Brasil dos dias de hoje, poderia ser comparado como de classe média, por isso, teve uma infância que lhe permitiu formação escolar, já Simão, oriundo de família pobre de pescadores, não teve escolarização, pois, no Brasil dos dias de hoje, seria, provavelmente, um pescador, conforme o pai. Sendo assim, podemos admitir que Pedro e Paulo estiveram durante um bom tempo, em lados opostos da mesma história.
        André e João, por ouvir falar que Jesus era o “Cordeiro de Deus” (Jo 1, 29), por meio das pregações de João Batista, próximo ao Rio Jordão, passaram a segui-lo. Estavam convencidos, pelas palavras e pela autoridade com que Jesus falava que Ele era mesmo o messias. Então, André levou Simão até Jesus (Jo 1, 40-42). Nessa ocasião eles moravam em Cafarnaum. Possuíam uma casa grande onde morava toda família, e, a partir daí, o próprio Jesus (Marcos 1, 26-36 e 2, 1).
        Não há relatos da impressão causada a Simão da sua primeira conversa com Jesus e a próxima só vai ocorrer junto ao Mar da Galileia (Mateus 4, 18-22), quando estão Simão, André, Tiago e João, na fatídica manhã depois de terem passado toda uma noite sem sucesso com a pesca. Nessa época Jesus passa chamar Simão de Pedro. Nome que vai gradualmente substituindo o antigo, Simão.
        Simão, agora Pedro, André, Tiago e João começam participar cada vez mais dos principais acontecimentos da vida de Jesus. Pedro, apesar de ter sido por várias vezes repreendido por Jesus, com palavras severas que não usava com qualquer outro dos seus discípulos (Mateus 16, 21-23; Marcos 8, 31-33) é chamado à categoria de apóstolo e torna-se “pescador de homens” (Mateus 4, 18-19), “Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja”.
Pedro sempre esteve presente na trajetória da vida pública de Jesus e mesmo depois da sua crucificação e morte. Pois, atende o pedido de Maria de Magdala e corre junto com João para confirmar a ausência do corpo de Jesus no túmulo onde fora sepultado e chegando ficaram confusos olhando os panos de linho deixados de lado. Jesus já havia ressuscitado e se revelava aos discípulos no caminho de Emaús (Lucas 24, 13-25), em seguida a Pedro as margens do Mar da Galileia, “Simão, filho de Jonas, tu me amas?” (Jo 21, 15-17) jesus perguntou três vezes a Pedro.
        Depois disso, Pedro só volta a aparecer em cena com os outros discípulos na ascensão (Atos 1, 13-22) e no dia de Pentecostes (Atos 2, 14-16), quando há uma silenciosa expansão do cristianismo em Jerusalém, Pedro é fundamental no processo. Por consequência disso, torna-se um homem firme na fé e exímio pregador dos ensinamentos de Cristo.
        Mas as coisas não foram nada fáceis para os primeiros cristãos. Haja visto o que aconteceu a Estevão, um dos sete primeiros diáconos da igreja nascente. Estevão foi detido e levado diante do Sinédrio[3] , onde foi condenado por blasfêmia, sendo sentenciado ao apedrejamento (Atos 7, 54-60). Estevão foi o primeiro mártir do cristianismo e Saulo estava entre os presentes na sua execução, pois já era um perseguidor de cristãos.
        Saulo, o perseguidor dos cristãos, falhou na sua missão quando alguns apóstolos conseguiram chegar ao exterior e fundar novas comunidades cristãs. Isso, o encheu de ódio, principalmente por ter ouvido dizer que os cristãos haviam se refugiados em Damasco. Saulo, mais que depressa, pediu autorização ao sumo-sacerdote, para prosseguir com sua perseguição.
        Mas quando Saulo se aproximou de Damasco, foi subitamente envolvido por uma luz que brilhava muito forte, Saulo cai do cavalo totalmente aterrorizado, no chão ouve uma voz que lhe falava aos ouvidos: “Saul, Saul, por que me persegues?” (Atos 9, 4). Em resposta Saulo pergunta: “Quem és, Senhor?” Ele disse: “Eu sou Jesus, a quem tu persegues” (Atos 9, 5). Assim, foi o momento que se iniciou sua conversão.
        A perseguição contra os cristãos havia se intensificado contra os apóstolos e alguns foram levados a prisão. Nesse momento Pedro deixa Jerusalém e vai para a Samaria, onde continua seu trabalho na edificação da igreja (Atos 8, 14-15). Depois de um tempo volta a Jerusalém, permanece por lá e nesse período conhece Paulo, o Saulo, já convertido (Atos 9, 26-28). Em nova viagem missionário, Pedro parte para Lida e Saron, onde cura Enéias, paralítico já a oito anos, e depois vai para Jope, onde vivia a discípula Tabita (Atos 9, 32-36). Em seguida, Pedro vai ao encontro de Cornélio e abre a porta da igreja aos gentios de Cesaréia (Atos 10).
        Pedro, retorna de Cesaréia para Jerusalém, onde foi novamente preso e liberto por um anjo. Refugiou-se na casa de Maria, mãe de Jesus, outra vez, vai encontrar Paulo, que junto com Barnabé foi enviado como representante ao Concílio em Jerusalém (Atos 15, 1-35, Gálatas 2, 1-10). O Concílio se deu devido a necessidade da igreja se reunir para discutir o problema que surgiu sobre a relação dos gentios com as leis de Moisés.
        Após o concílio, Pedro vai para Antioquia, cidade que se localizava às margens do rio Orontes, atual Turquia. Esta cidade foi a terceira maior cidade do Império Romano e do mundo, um terreno fértil para anunciação da palavra de Cristo, já que a mensagem não se limitava aos judeus, mas também aos de outras religiões. Inclusive foi lá que Paulo começou sua peregrinação em ajuda a Barnabé, pois o trabalho não era pouco.
        Sim, agora o perseguidor de cristãos passa ser perseguido. Pois, imediatamente a sua conversão, Paulo foi para Arábia (Gálatas 1, 15-20) permanecendo lá por três anos. É um momento de preparo na agitada vida missionária. Após sua volta a Damasco, começa a pregar corajosamente (Atos 9, 27), porém, logo foi obrigado a fugir dos judeus e ir para Jerusalém, onde ficou por três semanas. Novamente foi forçado a fugir da perseguição e voltar para sua cidade natal, Tarso (Atos 9,11; 21-39; Gálatas 1, 21-24).
        Barnabé, convoca Paulo para supervisionar a obra na Antioquia e, ele, respondeu prontamente ao chamado. Antioquia tornou-se um cenário de grande atividade cristã. Foi lá que os discípulos foram chamados pela primeira vez de “cristãos” (Atos 11, 25-26). Na Antioquia, Paulo, Barnabé e João Marcos são escolhidos e enviados como missionários aos gentios. Época fundamental na história da igreja, os discípulos cumprem o pedido do Mestre: “Ide por todo o mundo, e pregai o evangelho a toda criatura”. Os três missionários partiram de Selêucia, passando em Pafos, cruzaram para o continente, e seguiram até Perge (Atos 13, 13-14).
        Paulo e Barnabé prosseguiram por terra, passando por Panfília, província no centro do litoral sul da Ásia Menor. Pisídia, distrito na Ásia Menor, ao norte da Panfília e Licaônica, província interior da Ásia Menor, a oeste da Capadócia e ao sul da Galácia. Eles fizeram a mesma rota de volta com o objetivo de encorajar os convertidos nas cidades para cuidar das igrejas que foram formadas. Depois de um breve descanso na Antioquia, Pedro e Paulo se separam. Paulo propõe a Barnabé: “Voltemos para visitar os irmãos em todas as cidades onde pregamos a palavra do Senhor, para ver como estão indo” (Atos 15, 36).
        Paulo, porém, realizou outras viagens missionária. Revisitou as igrejas que havia fundado na Ásia e desejava entrar nas regiões próximas. Paulo ao chegar a Atenas, foi recebido com desprezo, vai para Corinto, de lá escreveu duas cartas à igreja de Tessalônica, por fim partiu para a Síria. Teve a companhia de Priscila e de Áquila até Éfeso, de Éfeso levou o evangelho para Colossos e Laodiceia, a cerca de 40 quilômetros a leste de Éfeso. Em Éfeso, Paulo escreveu sua Primeira Epístola aos Coríntios.
        Depois da passar pela Macedônia e cruzar a Ásia menor, Paulo chega a Mileto, de lá foi para Tiro e finalmente a Jerusalém, onde participou da festa de Pentecoste, por volta de 58 d.C. Em Jerusalém, Paulo foi preso e levado para Cesareia, por dois anos foi prisioneiro no pretório de Herodes sob a autoridade do governador Felix (Atos 23, 30-35). Foi julgado, privilégio concedido aos cidadãos romanos (Atos 25, 11-12) e condenado a cumprir prisão domiciliar sob guarda militar, em Roma.
O ano de sua libertação foi marcado por um grande incêndio na cidade de Roma, segundo o imperador Nero, ato provocado pelos cristões. Fora da prisão, Paulo retomou seus trabalhos missionários, visitou as comunidades fundadas na Europa e na Ásia Menor. Por fim, Nero condenou Paulo a morte por decapitação, em 66 d.C. Quanto a Pedro, especula-se que foi para o Oriente e ficou um bom tempo na Babilônia[i], no Eufrates (1Pedro 5, 13), onde, provavelmente, morreu entre os anos de 64 e 67 d.C.
        Chama-nos atenção, nesse período histórico de grande importância para a igreja, o fato de que entre os doze Apóstolos dois se destacaram de maneira distintas, Pedro e Paulo. De um lado Pedro, um pescador, discriminado pela sociedade da época, por ser humilde, rude e sem leitura e Paulo, que diferente de Pedro se criou em Jerusalém e se tornou doutor da Lei, era considerado cidadão romano e como tal comandou as primeiras perseguições contra a Igreja de Cristo.
        Pedro é escolhido por Jesus por ser um homem sensível para compreender e aceitar a missão que tinha pela frente. Jesus se aproxima de Simão e André e faz um convite: “vem e segue-me!” eles o seguiram deixando para traz tudo que tinham (Mt 4, 18-22). Já Paulo foi provado por Jesus e ao se converter radicalmente aceitou a missão, não à toa Jesus o escolheu para ser o apóstolo dos estrangeiros. Nesse contexto, Pedro e Paulo vivenciaram em comum a responsabilidade de conduzir os primeiros cristãos, auxiliados pelos outros apóstolos, ou seja, por isso, tornaram-se os pilares da igreja.





Referências

Schokel, Luis Alonso. Bíblia do Peregrino, 3ª ed. Editora Paulus, São Paulo - SP, 2011.

Bohn Gass, Ildo. Org. Coleção Uma Introdução à Bíblia – CEBI, As Comunidades Cristãs da Primeira Geração. 7ª ed. Editora Paulus, São Paulo - SP, 2005.

Bohn Gass, Ildo. Org. Coleção Uma Introdução à Bíblia – CEBI, As Comunidades Cristãs a partir da segunda Geração. 2ª ed. Editora Paulus, São Paulo - SP, 2011.

MESTERS, Carlos. Coleção Por Trás das Palavras – CEBI, Paulo Apóstulo: um trabalhador que anuncia o Evangelho. 4ª ed. Editora Paulus, São Paulo, 1991.



[1] João Crispim Victorio é professor, especialista em educação e poeta.

[2] Fariseu: partido que se originou no tempo de Antíoco Epifânio. Outros dois partidos eram os essênios e os saduceus. Os fariseus eram extremamente precisos e minuciosos em todos os assuntos concernentes à lei de Moisés (Mateus 9, 14; 23,15; Lucas 11, 39; 18, 12).

[3] Sinédrio: Assembleia suprema de Jerusalém.

[i] Por volta de 1900 a.C., surge uma nova civilização, a Babilônia. Logo se transformou em um dos mais prósperos e importantes centros urbanos de toda a Antiguidade. O rei Hamurábi elaborou o mais antigo código de leis escrito do mundo, o chamado Código de Hamurábi. As distinções presentes na sociedade babilônica também eram levadas em consideração. Com isso, o rigor das punições dirigidas a um escravo não era o mesmo imposto a um comerciante.

Mesmo promovendo tantas conquistas e construindo um Estado bastante organizado, os babilônicos não conseguiram resistir a uma onda de invasões que aconteceu após o governo de Hamurábi. Por volta de 612 a.C., a sublevação dos povos dominados e a ação invasora dos amoritas e caldeus instituíram o fim do Império Assírio e a organização do Segundo Império Babilônico.

Nesse novo contexto, podemos destacar a ação do Imperador Nabucodonosor, que reinou entre os anos de 612 e 539 a.C. Durante o seu governo, a civilização babilônica vivenciou o auge do desenvolvimento, os luxuosos palácios e os Jardins Suspensos da Babilônia, uma das Sete Maravilhas do Mundo Antigo. O regime de Nabucodonosor também ficou conhecido pelo estabelecimento de novas conquistas territoriais, entre as quais se destacam a região sul da Palestina e as fronteiras setentrionais do Egito. Após este governo, os domínios babilônicos foram paulatinamente conquistados pelos persas, que eram comandados pela batuta política e militar do rei Ciro I.


As duas cartas atribuídas a Pedro não foram escritas por ele, pois, na época em que foram escritas Pedro já havia morrido.

O Corpus Paulinos registra treze cartas, porém, apenas sete foram escritas por Paulo: 1Tessalonicenses, 1 e 2 Coríntios, Romanos, Gálatas, Filipenses e Filemon. As outras seis: Tito, 1 e 2 Timóteo, Efésios, Colossenses e 2 Tessalonicenses, foram escritas por seus discípulos após sua morte.

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