O importante foi a conversação de natureza espiritual na qual se misturavam observações políticas.. Lula é um homem religioso, mas da religiosidade popular para a qual Deus é uma evidência existencial. Encontei-o lendo um livro meu, “O Senhor é meu pastor”,(da Vozes) um comentário do famoso salmo 23 o mais lido dos salmos e também por outras religiões. Sentia-se fortificado e confirmado, pois a Bíblia geralmente critica os pastoes políticos e exalta aqueles que cuidam dos pobres, dos órfãos e das viúvas. Lula se sente nesta linha, com suas política sociais que beneficaram a tantos milhões. Não aceita a crítica de populista, dizendo: eu sou povo e vim do povo e oriento o mais que posso a política para ele.
Na cabeceira da cama há um crucifixo. Aproveita o tempo de reclusão estrita para refletir, meditar, rever tantas coisas de sua vida e aprofundar as convicções fundamentais que dão sentido a sua ação política, aquilo que sua mãe Lindu (que a sente como um anjo protetor e inspirador) sempre lhe repetia: sempre ser honesto e lutar e mais uma vez lutar. Vê nisso o sentido de sua vida pessoal e política: lutar para que haja vida digna para todos e não só para alguns à custa dos outros. A grandeza de um político se mede pela grandeza de sua causa, disse enfaticamente. E a causa tem que ser produzir vida para todos a começar pelos que menos vida têm. Em função disso não aceita derrotas definitivas. Nem quer cair de pé. O que não quer é cair. Mas manter-se fiel a seu propósito de base e fazer da política o grande instrumento para ordenar a vida em justiça e paz para todos, particularmente aos que vivem no inferno da fome e da miséria.
Esse sonho possui grandeza ética e espiritual inegável. É à luz destas convicções que se mantém tranquilo, pois diz e repete: vive desta verdade interior que possui força própria e vai se revelar um dia. “Só quero”, comentava, “que seja depois de minha morte, mas ainda em meu tempo de vida”. Indigna-se profundamente por causa das mentiras que divulgam contra ele e sobre elas montaram o processo do triplex. Pergunta-se, como podem as pessoas mentirem conscientemente e poderem dormir em paz? Faz um desafio ao juiz Sérgio Moro: “apresente-me uma única prova sequer, de que sou dono do triplex de Guarujá. Se aprensentar renunciarei à candidatura à presidência”. Recomendou-me que passasse esse recado à imprensa e aos que estão no acampamento:“Sou candidatíssimo. Quero levar avante o resgate dos pobres e fazer das política sociais em prol deles, políticas de Estado e que os custos que são investimentos entrem no orçamento da União. Irei radicalizar estas políticas para os pobres, junto com os pobres e dignificar nosso país”.
A meditação o fez entender que esta prisão possui um significado que transcende a ele, a mim e às disputas políticas. Deve ser o mesmo preço que Gandhi e Mandela pagaram com prisões e perseguições para alcançarem o que alcançaram. “Assim creio e espero”, dizia, “que é o que estou passando agora”.
Eu que entrei para anima-lo, saí animado. Espero que outros também se animem e gritem o “Lula livre” contra uma Justiça que não se mostra justa.
Leonardo Boff é teólogo e escreveu: Brasil: concluir a refundação ou prolongar a dependênciancia,Vozes 2018.
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