sábado, 16 de maio de 2020

O Renascimento, a Revolução Científica e os Índios Brasileiros 
João Crispim Victorio[1]

O Renascimento foi um movimento cultural, econômico e político que surgiu na Itália, nas cidades de Veneza, Gênova e Florença, do século XIV. Se consolidou no século XV e se estendeu até o século XVII, por toda a Europa. O movimento cresceu e consegui romper com a escolástica, que dominou toda a Idade Média, tornando possíveis algumas modificações na estrutura da sociedade, culminando em reformulações da vida medieval, dando início à Idade Moderna, período que corresponde ao final do Feudalismo e início do Capitalismo.
As manifestações precursoras desse movimento se deram por meio dos poetas Petrarca e Boccaccio[2], que inspirados nos valores da Antiguidade Clássica, incentivaram outros poetas, além de pintores, escultores e escritores, desafiando a filosofia de vida da época. Nesse momento, uma importante mudança no modo de ver o mundo estava nascendo, deixava-se de lado o pensamento teocêntrico, para uma visão de mundo antropocêntrica. Ou seja, caía por terra uma doutrina que explicava tudo a partir de uma origem divina, substituindo-a por um novo pensamento onde o homem passa ter papel central em relação ao Universo.
Neste sentido, os renascentistas divulgavam que a razão era o único caminho para se chegar ao conhecimento e, que pela razão e pela ciência, tudo podia ser explicado. De acordo com esse pensamento a razão era uma manifestação do espírito humano que ao exercer sua capacidade de questionar o mundo, dava vazão a um dom concedido por Deus.
Nesta perspectiva, surge o Humanismo, um movimento intelectual de valorização da condição humana, suas realizações e descobertas nos campos da ciência, da literatura e das artes. Um movimento de glorificação do homem e da natureza humana, que na sua essência, buscava interpretar o cristianismo utilizando as obras de Platão[3]. Dessa forma o homem, obra perfeita do Criador, teria a capacidade de compreender, modificar e até mesmo dominar a natureza. Tal pensamento provocou mudanças no ensino universitário, com a introdução de disciplinas poesia, história e filosofia.
Durante o Renascimento surgiu uma nova classe social, a burguesia. Isso só foi possível devido ao desenvolvimento naval que proporcionou a expansão marítima por meio das “Grandes Navegações” dinamizando o comércio e fortalecendo as pequenas cidades, caracterizadas pela vida em trânsito, entre o urbano e o rural. Em torno dessas cidades eram formados pequenos vilarejos que dependiam do que as mesmas tinham a oferecer, isto é, trocas, compra e venda de produtos, feiras, todo tipo de serviços, pontos de encontro de mercadores e camponeses. 
No campo científico, o Renascimento foi marcado por importantes descobertas. Podemos destacar os estudos de astronomia que se consolidou com a teoria heliocêntrica[4], defendida por Nicolau Copérnico, depois por Galileu Galilei e por Giordano Bruno. Estudos importantes que foram antes produzidos por Ptolomeu[5]. Tal concepção abalou o monopólio dos saberes, até então controlados pela Igreja, além de muitas outras descobertas no campo da física, da medicina, da matemática e da geografia.
O polonês Nicolau Copérnico, negou a teoria geocêntrica[6] defendida pela Igreja e afirmou que a terra não era o centro do universo, mas simplesmente um planeta que gira em torno do Sol. Galileu Galilei descobriu os anéis de Saturno, as manchas solares, os satélites de Júpiter. Mas teve que negar publicamente suas ideias e descobertas, pois foi perseguido e ameaçado pela Igreja. Na medicina os conhecimentos avançaram com trabalhos e experiências sobre circulação sanguínea, métodos de cauterização e princípios gerais de anatomia.
O Renascimento científico na Europa foi responsável pela criação de técnicas que fundamentaram a ciência moderna. O Método Científico, com a elaboração de hipóteses e as observações experimentais, elaborados por Francis Bacon[7], foi o princípio fundamental para o desenvolvimento que ocorreria nas ciências nos séculos seguintes, em especial no período do Iluminismo[8]. O cientificismo tratou de diversas questões sobre o conhecimento em diversas áreas científicas como a Biologia, Matemática, Física, Astronomia, Botânica, Anatomia, Química, que foram importantes para a mudança de pensamento da humanidade.
Como visto antes, o Renascimento foi um movimento cultural, econômico e político que se iniciou na Europa, no século XIV. Durante o período surgiu a burguesia e o meio científico foi marcado por importantes descobertas que facilitaram, por exemplo, “As Grandes Navegações”, ou seja, a expansão marítima onde países da Europa, particularmente Portugal e Espanha, passaram a colonizar as terras já habitadas no chamado “Novo Mundo”.
É bom salientar aqui que quando falamos de “Novo Mundo”, visão eurocêntrica da América, estamos nos referindo ao Continente Americano que é banhado pelo Oceano Atlântico a Leste e Pacífico a Oeste. Temos duas importantes divisões regionais, uma divide o Continente em América do Norte, América Central e América do Sul[9], e a outra o divide em América Latina e Anglo-Saxônica. A América Latina engloba os países da América do Sul e Central em conjunto com o México, já a América Anglo-Saxônica conta apenas com Estados Unidos e Canadá.
No nosso caso específico vamos nos referir a América do Sul, formada por seus 12 países entre estes o Brasil. Segundo VICTORIO (2018, p.15) “Antes da chegada, aqui, de Cristóvão Colombo e depois de Pedro Alvares Cabral, as Américas já eram ocupadas por vários povos”. Sendo assim, quem eram e quantos eram esses povos? Como se organizavam social e culturalmente? Perguntas estas que na época, nem talvez hoje, tenham sido feitas, e lógico não foram respondidas. Isso, porque, conforme Victorio,

Durante quase cinco séculos, os índios foram pensados como seres em transição para a civilização ou, por fim, o desaparecimento. Isso significa dizer que tinham uma escolha a fazer, porém, em ambos os casos, desfavorável a eles. (VICTORIO, 2018, p.18) 

Infelizmente é dessa forma que os nativos brasileiros são vistos. É uma pena que nossa sociedade, ainda, não tenha percebido que os indígenas possuem, cada grupo de forma diferente, suas tradições, seus idiomas e suas manifestações artísticas e culturais. Assim, também, como a maneira de educar, de fazer ciência e de se relacionar com a natureza.
Ainda, conforme Victorio:

Na concepção indígena, o mundo é uma grande rede de relações entre humanos e não humanos. Isso significa dizer que os homens estão sempre interagindo com a natureza, dependem dela e, ao mesmo tempo, são parte dela. (VICTORIO, 2018, p.71) 

Dessa forma, temos que considerar e respeitar os saberes indígenas gerados a partir de milhares de anos de observações se experiências empíricas compartilhadas no intuito de garantir o modo específico de vida. Para eles o acesso ao saber científico está ao alcance de todos, são públicos, embora sejam respeitadas as competências e as aptidões individuais, como as de domínio do pajé.
Os índios, por exemplo, sempre trabalharam com fitoterápicos, ciência que existe no meio indígena há séculos, utilizando a flora na prevenção e na cura de todos os males. Assim também ocorre com a Astronomia indígena, suas constelações e o os humanos vivem intimamente conectados e nessa profunda conexão o céu, os astros e a terra são uma coisa só.
Por tanto, é bom ter clareza que da mesma forma que a vida, em toda sua dimensão acontecia na Europa, na África, na Ásia, na Oceania e na Antártida, nos últimos mil anos, também acontecia nas Américas. Hoje, sem dúvidas, com as novas descobertas antropológicas e paleontólogas podemos dizer que a ciência indígena, apesar de empírica, vem contribuindo na universalização e sistematização do saber com suas tradições milenares.


BIBLIOGRAFIA:

CHASSOT, Áttico. A ciência através dos tempos. 2ª edição, São Paulo: Moderna, 2004.
FERNANDES, Luiz Estevam de Oliveira; FERREIRA, João Paulo Mesquita Hidalgo. “A nova medida do Homem”. In: Nova História Integrada – Ensino Médio Volume Único. Campinas: Companhia da Escola, 2005. pp. 111-112.
GOMBRICH, Ernest H. A história da arte. Rio de Janeiro: Editora LTC, 2011.
LIMA, Lizânias de Souza; PEDRO, Antonio. “O Renascimento e a cultura na época do absolutismo”. In: História da civilização ocidental. São Paulo: FTD, 2005. pp. 154-155.
JANSON, H.W. História geral da arte: Renascimento e Barroco. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
SOUSA, Rainer Gonçalves. "Renascimento"; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/historiag/renascimento.htm. Acesso em 29 de abril de 2020.
VICTORIO, João Crispim, Nativos de Pindorama: Conhecer para respeitar é preciso. Rio de janeiro: Autografia, 2018.

[1] Professor, Especialista em Educação e Poeta. 
[2] Francisco Petrarca e Giovanni Boccaccio, foram filósofos, críticos literários e poetas italiano que lideraram o surgimento do Renascimento humanista.
[3] Platão foi um filósofo do período clássico da Grécia, discípulo de Sócrates e o primeiro teórico idealista. Autor de diversos diálogos filosóficos e fundador da Academia em Atenas, a primeira instituição de educação superior do mundo ocidental. Ajudou a construir os alicerces da filosofia natural, da ciência e da filosofia ocidental. Escreveu sobre diversos temas, como amor, amizade, política, justiça, imortalidade da alma, entre outros.
[4] O heliocentrismo é o atual Modelo de configuração do Sistema Solar. Diz que a Terra gira ao redor do Sol com certa periodicidade e velocidade. Esse movimento define as estações do ano e o dia e a noite.
[5] Cláudio Ptolomeu foi um cientista, astrônomo e geógrafo de origem grega. Foi um dos últimos grandes cientistas do mundo helenístico, autor dos estudos de astronomia mais importantes produzidos antes de Copérnico.
[6] Modelo mais antigo de configuração do Sistema Solar. Essa ideia remonta desde a Antiguidade. Segundo o qual a Terra era o centro do Universo, com todos os planetas e o Sol girando ao seu redor.
[7] Francis Bacon (1561-1626) foi filósofo, político e ensaísta inglês. Foi importante na formulação de teorias que fundamentaram a ciência moderna. É considerado o pai do método experimental.
[8] O movimento Iluminista foi um influente processo cultural, social, filosófico e político que tem suas origens no século XVII, com a Revolução Industrial. Possibilitado pela pesquisa efetuada por René Descartes (1596-1650) e Isaac Newton (1643-1727), se desenvolveu plenamente durante o século seguinte.
[9] A América do Norte: Canadá, Estados Unidos e México.
A América do Sul: Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Equador, Guiana, Paraguai, Peru, Suriname, Uruguai e Venezuela.
A América Central: Antígua e Barbuda, Bahamas, Barbados, Belize, Costa Rica, Cuba, Dominica, El Salvador, Granada, Guatemala, Haiti, Honduras, Jamaica, Nicarágua, Panamá, República Dominicana, Santa Lúcia, São Cristóvão e Névis, São Vicente e Granadinas, Trinidad e Tobago.




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