sexta-feira, 10 de novembro de 2017

           Moço

            I

Tenho mais idade do que devia
Claro, não sou nenhum menino!
Vivi tantas coisas intensas
Transitei por muitos lugares
Cidades com grandes ruas
Becos estreitos de favelas
Enquanto você ficava em casa
Jogando videogame ou assistindo tv...

Vendi picolé na estação de trem
Com os hippies aprendi artesanato
A me virar nas areias das belas praias
Rio de muita gente, das várias raças
Da zona sul à costa verde
Só conhece quem viaja...

Sempre dei um jeito de frequentar a sala de aula
Cresci de forma contrária à sua
Entre os ignorantes amontoados da periferia
Curtindo churrasquinho de rua
Sobrevivi sem perder a ternura
Subi ao céu e desci ao inferno
Como muita gente boa!
Só não fiz a opção certada – Acredito!
Por isso, estou vivo agora...

                  II

Tenho mais idade do que devia
No conceito dessa sociedade mesquinha
Completei meus estudos no horário noturno
Trabalhando e estudando fiz o tempo acontecer
Não desisti, apesar das dificuldades que sofri
Com tudo só defendi meu querer...

Conheci muitas mulheres
Algumas da minha vida fizeram parte
No caminho encontrei gente interessante
Poucas, hoje, chamo amigas!
Mas me decepcionei bastante...

Desde muito moço frequento a Lapa
Vi a malandragem na noite
O trabalhador sem gravata de dia
Sozinho lamentando a vida
Igual ao sujeito que vive na boemia...

Mesmo ficando longe de onde morava
Frequentei teatros e casas noturnas
Grandes praças com chafariz
Projetos culturais em locais públicos
Espetáculos que mereciam bis...

Passei a me interessar por Poesia
Política e Filosofia são minhas guias
Buscava assim amadurecer minha Ideologia
Viajei a outros Estados da federação
Atravessei o atlântico de avião
Cheguei ao velho mundo
Ao centro dos acontecimentos
O coração!

                 III

Tenho mais idade do que devia
É o que percebo quando penso seguir em frente
A Universidade também exclui por idade
As vagas, na verdade, já estão preenchidas
A vida acadêmica é cara para a maioria da gente
Um círculo vicioso que aos poucos chega ao final
Pobre burguês que quer tudo para si
Não entende da Terra o sinal...

Há vinte anos no mesmo emprego
Sou um profissional bem-sucedido
Porém, sem dinheiro!
Cumpro com meus deveres
Cobro com veemência meus direitos
Priorizo o trabalhador organizado
Sou presente no Sindicato
Aceito os novos desafios...

Tenho mais idade do que devia
É o que vejo no olhar de muita gente
Aquelas não assumidas!
Reparam as minhas roupas desbotadas
O meu tênis já descorado
As minhas sandálias já surradas
O contraste com meus cabelos grisalhos
Reparam o meu modo de ser
O meu jeito de falar
O contraste com meu rosto já cansado...

Imagino o que dizem
Esta gente fria, claro!
Ao me ver nas ruas de mãos dadas
Ao me ver no banco da praça
Beijar, apaixonado, minha namorada
Quanta hipocrisia!

Poema de João Crispim Victorio.
Livro: Sobre o Trabalho que Falo...

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