quinta-feira, 23 de novembro de 2017

Os excluídos e as leis brasileiras.
João Crispim Victorio[i]

Está tramitando no Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 3.547/2015, que Altera o Art. 26-A da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, incluindo a História e a Cultura Cigana no currículo oficial da rede de ensino.  O PL em questão vem substituir a Lei 11.645/2008, que alterou o mesmo artigo da Lei nº 9.394, incluindo a História e a Cultura Indígena no currículo oficial da rede de ensino. Já a Lei 11.645/2008, havia substituído, anteriormente, a Lei 10.639/2003, que nasceu no intuito de incluir no currículo oficial, somente, a obrigatoriedade da História e da Cultura Afro-Brasileira.
A alteração na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB/96, proposta por meio do PL nº 3.547/2015, ocorre no Artigo 26-A, especificamente nos parágrafos primeiro e segundo que passará vigorar com a seguinte redação:


“Art. 26–A Nos estabelecimentos de ensino fundamental e de ensino médio, públicos e privados, torna–se obrigatório o estudo da história e cultura afro–brasileira, indígena e cigana.

§ 1º O conteúdo programático a que se refere este artigo incluirá diversos aspectos da história e da cultura que caracterizam a formação da população brasileira, a partir desses três grupos étnicos, tais como o estudo da história da África e dos africanos, a história cigana, a luta dos negros, dos ciganos e dos povos indígenas no Brasil, a cultura negra, cigana e indígena brasileira e o negro, o cigano e o índio na formação da sociedade nacional, resgatando as suas contribuições nas áreas social, econômica e política, pertinentes à história do Brasil.

§ 2º Os conteúdos referentes à história e cultura afro–brasileira, dos povos ciganos e dos povos indígenas brasileiros serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de educação artística e de literatura e história brasileiras”.

É preciso dizer, aqui, que não temos nada contra a inclusão da História e da Cultura dos povos ciganos no texto atual da LDB/96. Pelo contrário, estamos de acordo com o deputado[1], autor do referido Projeto de Lei, que justifica sua ação com o seguinte argumento histórico:

“Os povos ciganos sempre vivenciaram situação de extremo preconceito e exclusão social, onde quer que estejam. A cultura cigana sempre foi desconsiderada e desrespeitada, a imagem construída socialmente sobre o povo cigano é de total descompasso com a realidade, eivada na discriminação que os acompanham por séculos. Desde a escravização por 5 séculos na região da atual Romênia aos horrores impostos nos campos de concentrações nazistas de Adolf Hitler”.

A história mostra a necessidade de se fazer o devido reconhecimento ao povo cigano, mas a questão é que no Brasil, historicamente, temos muitas leis que não são colocadas em práticas. Pior, as nossas leis, em sua maioria, giram em torno dos interesses individuais dos que detêm o poder do capital, o poder político e o poder da informação, sejamos justos, esse não parece ser o caso do autor da PL nº 3.547/2015.
 Nossa história mostra que as nossas leis sempre foram e, ainda as são elaboradas por parlamentares, em sua maioria, representantes das elites financeira e intelectual. Neste sentido, estamos carecendo de gente no parlamento brasileiro que pense, defenda e pratique o bem coletivo. Gente que venha somar em defesa das causas dos mais pobres e oprimidos, que ajude mobilizar a população para fazer valer as leis que, pelo menos, minimize o fosso da desigualdade social[2].
O projeto de Lei nº 3.547/2015, modifica a Lei nº 11.645/2008, que modificou Lei no 10.639/2003, que alterou o Artigo 26-A da Lei nº 9.394/1996. Estamos caminhando para 15 anos da Lei nº 10.639/2003 e 22 anos da entrada em vigor da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e não conseguimos atingir o nosso primeiro objetivo que é o de formar professores capazes de aprofundar as temáticas afro-brasileira e indígenas, quiçá, agora, a cigana. Então, será que acrescentando mais um grupo de excluídos a lei vai ser colocada em prática? Ou todos os grupos étnicos aqui citados vão continuar sendo apenas figuras estampadas nos livros didáticos como se não existissem de verdade? Será que devemos continuar negando a importante contribuição dessas culturas em nossa sociedade? Bom, as leis são importantes, mas o mais importante mesmo é colocá-las em prática.
Os indígenas e os negros, têm no calendário brasileiro datas distintas de homenagens. Façamos, então, dessas datas, não só comemorações, mas, também, reflexões sobre os problemas vividos no cotidiano e luta pela vida. Para tanto, não basta colocar penas na cabeça ou fazer pintura no rosto e no corpo, é preciso muito mais. É preciso recuperar a verdadeira história desses povos e denunciar o descaso que sofrem do poder público, o preconceito e discriminação suscitada por uma minoria da população que age, segundo seus interesses próprios, como por exemplo, a ganância de se apropriarem das terras indígenas.
Afinal, temos muito a aprender, a compartilhar e vivenciar com todos esses povos. Pois, o futuro de um povo depende da própria história que constrói.




Rio de Janeiro, 20 de novembro de 2017.






[1] Helder Ignácio Salomão é deputado federal pelo PT do Espírito Santo.

[2] Neste contexto, desigualdade social é o desequilíbrio econômico causado pela distribuição desigual da renda na sociedade e a falta de investimentos em políticas sociais, ou seja, poucos ficam com muito e muitos ficam com pouco. Isso, afeta diretamente as pessoas causando diferentes padrões de vida em um mesmo país. Os problemas da desigualdade social se configuram, principalmente na falta de educação básica e superior de qualidade, no desemprego, na falta de saneamento básico, de saúde e na ausência de projetos culturais nas periferias das cidades.
No Brasil, a desigualdade social é gritante e afeta a maioria do povo brasileiro. Vivemos uma contradição absurda, pois, estamos entre os dez países com o Produto Interno Bruto-PIB mais alto do mundo e somos o oitavo país com maior índice de desigualdade social e econômica do planeta. Apesar da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad-2011) apresentar resultados que mostram uma diminuição da pobreza no país. 





[i] Professor, Especialista em Educação e Poeta.

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