Os excluídos e as leis brasileiras.
João Crispim Victorio[i]
Está tramitando no Congresso Nacional o Projeto de Lei
nº 3.547/2015, que Altera
o Art. 26-A da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, incluindo a História e
a Cultura Cigana no currículo oficial da rede de ensino. O PL em questão vem substituir a Lei
11.645/2008, que alterou o mesmo artigo
da Lei nº 9.394, incluindo a História e a Cultura Indígena no currículo
oficial da rede de ensino. Já a Lei 11.645/2008, havia substituído, anteriormente,
a Lei 10.639/2003, que nasceu no intuito de incluir
no currículo oficial, somente, a obrigatoriedade
da História e da Cultura Afro-Brasileira.
A
alteração na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB/96, proposta por meio do PL nº 3.547/2015, ocorre no Artigo
26-A, especificamente nos parágrafos primeiro e segundo que passará vigorar com
a seguinte redação:
“Art. 26–A Nos estabelecimentos de
ensino fundamental e de ensino médio, públicos e privados, torna–se obrigatório
o estudo da história e cultura afro–brasileira, indígena e cigana.
§ 1º O conteúdo programático a que se
refere este artigo incluirá diversos aspectos da história e da cultura que
caracterizam a formação da população brasileira, a partir desses três grupos
étnicos, tais como o estudo da história da África e dos africanos, a história
cigana, a luta dos negros, dos ciganos e dos povos indígenas no Brasil, a cultura
negra, cigana e indígena brasileira e o negro, o cigano e o índio na formação
da sociedade nacional, resgatando as suas contribuições nas áreas social,
econômica e política, pertinentes à história do Brasil.
§ 2º Os conteúdos referentes à história
e cultura afro–brasileira, dos povos ciganos e dos povos indígenas brasileiros
serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas
de educação artística e de literatura e história brasileiras”.
É
preciso dizer, aqui, que não temos nada contra a inclusão da História e da
Cultura dos povos ciganos no texto atual da LDB/96. Pelo contrário, estamos de
acordo com o deputado[1],
autor do referido Projeto de Lei, que justifica sua ação com o seguinte
argumento histórico:
“Os povos ciganos sempre vivenciaram
situação de extremo preconceito e exclusão social, onde quer que estejam. A
cultura cigana sempre foi desconsiderada e desrespeitada, a imagem construída
socialmente sobre o povo cigano é de total descompasso com a realidade, eivada
na discriminação que os acompanham por séculos. Desde a escravização por 5
séculos na região da atual Romênia aos horrores impostos nos campos de
concentrações nazistas de Adolf Hitler”.
A
história mostra a necessidade de se fazer o devido reconhecimento ao povo
cigano, mas a questão é que no Brasil, historicamente, temos
muitas leis que não são colocadas em práticas. Pior, as nossas leis, em sua
maioria, giram em torno dos interesses individuais dos que detêm o poder do
capital, o poder político e o poder da informação, sejamos justos, esse não
parece ser o caso do autor da PL nº 3.547/2015.
Nossa história mostra que as
nossas leis sempre foram e, ainda as são elaboradas por parlamentares, em sua
maioria, representantes das elites financeira e intelectual. Neste sentido,
estamos carecendo de gente no parlamento brasileiro que pense, defenda e
pratique o bem coletivo. Gente que venha somar em defesa das causas dos mais pobres e oprimidos, que ajude mobilizar a população para fazer valer as leis que, pelo menos, minimize o fosso da desigualdade social[2].
O projeto de Lei nº 3.547/2015, modifica a Lei nº 11.645/2008, que modificou Lei no 10.639/2003,
que alterou o Artigo 26-A da Lei nº 9.394/1996. Estamos caminhando para 15 anos
da Lei nº 10.639/2003 e 22 anos da entrada em vigor da Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional e não conseguimos atingir o nosso primeiro
objetivo que é o de formar professores capazes de aprofundar as temáticas afro-brasileira
e indígenas, quiçá, agora, a cigana. Então, será
que acrescentando mais um grupo de excluídos a lei vai ser colocada em prática?
Ou todos os grupos étnicos aqui citados vão continuar sendo apenas figuras
estampadas nos livros didáticos como se não existissem de verdade? Será que
devemos continuar negando a importante contribuição dessas culturas em nossa
sociedade? Bom, as leis são importantes, mas o mais importante mesmo é
colocá-las em prática.
Os indígenas e os negros, têm no calendário brasileiro datas distintas de
homenagens. Façamos, então, dessas datas, não só comemorações, mas, também, reflexões
sobre os problemas vividos no cotidiano e luta pela vida. Para tanto, não basta
colocar penas na cabeça ou fazer pintura no rosto e no corpo, é preciso muito
mais. É preciso recuperar a verdadeira história desses povos e denunciar o
descaso que sofrem do poder público, o preconceito e discriminação suscitada
por uma minoria da população que age, segundo seus interesses próprios, como
por exemplo, a ganância de se apropriarem das terras indígenas.
Afinal, temos muito a aprender, a compartilhar e vivenciar com todos
esses povos. Pois, o futuro de um povo depende da própria história que
constrói.
Rio de Janeiro, 20 de novembro de 2017.
[1] Helder Ignácio Salomão é deputado federal pelo PT do Espírito Santo.
[2] Neste contexto, desigualdade social é o
desequilíbrio econômico causado pela
distribuição desigual da renda na sociedade e a falta de investimentos em políticas sociais,
ou seja, poucos ficam com muito e muitos ficam com pouco. Isso, afeta
diretamente as pessoas causando diferentes padrões de vida em um mesmo país. Os
problemas da desigualdade social se configuram, principalmente na falta de educação básica e superior de
qualidade, no desemprego, na falta de saneamento básico, de saúde e na ausência
de projetos culturais nas periferias das cidades.
No Brasil, a desigualdade social é
gritante e afeta a maioria do povo brasileiro. Vivemos uma contradição absurda,
pois, estamos entre os dez países com o Produto Interno Bruto-PIB mais alto do
mundo e somos o oitavo país com maior índice de desigualdade social e econômica
do planeta. Apesar da Pesquisa Nacional
por Amostra de Domicílios (Pnad-2011) apresentar resultados que
mostram uma diminuição da pobreza no país.
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