Gestão Democrática: princípio do projeto político pedagógico
São
vários os documentos oficiais que tratam diretamente da educação brasileira,
como a Constituição Federal de 1988, a Lei de Diretrizes e Bases de 1996 e o atual
Plano Nacional de Educação (2011- 2020), entre outros, não menos importantes. Sendo
os dois últimos os que mais diretamente citam as várias ações de organização no
espaço escolar, determinantes à elaboração do projeto político pedagógico,
entre as ações destacamos a participação de todos os agentes educacionais
envolvidos direta e indiretamente no processo educativo, mas, infelizmente, na
prática nada disso parece ter sentido, já que os professores estão pouco
acostumados à participação coletiva no campo social e político.
Nesse
contexto torna-se difícil a compreensão de democracia no ambiente local de
trabalho. Nossa forma de participação é limitada pela representação e, a partir
daí, está tudo resolvido. Sendo assim, fica prejudicada a gestão democrática do
ensino público, já que a mesma é instituída por meio do reconhecimento da
função política da educação. Isso se deu frente aos rumos da sociedade na luta
pela democratização do país, a partir da Constituição Federal de 1988 e logo
após pela LDB de 1996, que introduzem os princípios da democracia, da autonomia
e da construção coletiva em um novo tipo de organização da gestão escolar.
Muitas
são as pedras no caminho para dificultar a consolidação de uma sociedade de
homens e mulheres conscientes de seus direitos e deveres. A educação seria,
podemos dizer assim, um caminho para formação de tal sociedade, não fossem os
problemas de ordem natural, referente a dinâmica social: o professor é um
indivíduo que saí dessa sociedade despolitizada e forma novos indivíduos,
consequentemente, despolitizados, numa roda viva; de ordem intervencionista, o
realinhamento do Estado brasileiro com as reformas neoliberais, sistematizadas
no Consenso de Washington[1],
o Banco Mundial assumiu posição expressiva no financiamento da educação básica.
Esta nova posição teve como marco a Conferência Mundial sobre Educação para
Todos[2],
realizada na Tailândia (1990). O compromisso explícito dos países, que
participaram do evento, inclusive o Brasil, com a nova agenda do Banco Mundial,
confirma‐se
com a elaboração do Plano Decenal de Educação (1993‐2003)[3].
O
Plano Decenal de Educação, ao mesmo tempo em que consolida os acordos de
financiamento, define a agenda de atuação do Banco Mundial, na política
educacional, propondo a universalização da Educação Básica associada à
valorização do magistério. Para tanto, foi previsto um novo padrão de gestão
educacional por meio de um reordenamento que garantisse à escola o
fortalecimento da gestão e a ampliação da autonomia como prioritário na
política educacional.
Partindo
do pressuposto de que a escola precisava se adequar às novas demandas sociais,
a política educacional foi sendo redefinida. Nessa expectativa o Plano Decenal
é elaborado para ser um instrumento guia na recuperação da educação básica do
país e o projeto político pedagógico surge como imprescindível para
implementação do PDE. Textualmente ficava claro que toda escola precisava fazer
o seu plano e definir metas e compromissos com a comunidade escolar. Neste
sentido, a partir da década de 90, a descentralização e a autonomia do espaço
escolar, características importantes na construção da gestão democrática, se
dão com o objetivo de transferir recursos diretos para os estabelecimentos
públicos de Ensino Fundamental e destinava‐se ao “atendimento de
necessidades imediatas de manutenção e de projetos de iniciativa da unidade
escolar, de modo a fortalecer sua autonomia” (FUNDESCOLA, 2008).
(...)
O ensino democrático é aquele que, sendo estatal, não está subordinado ao
mandonismo de castas burocráticas, nem sujeito às oscilações dos
administradores do momento. Tem, isto sim, currículo, condições de ingresso,
promoção e certificação, bem como métodos e materiais discutidos amplamente com
a sociedade, de modo que os interesses da maioria, em termos pedagógicos, sejam
efetivamente respeitados. O ensino democrático é, também, aquele cuja gestão é
exercida pelos interessados, seja indiretamente, pela intermediação do Estado
(que precisamos fazer democrático), seja diretamente, pelo princípio da
representação e da administração colegiada (2009, p. 5-10).
Conforme a autora um dos mais
importantes princípios da gestão democrática é a autonomia. Mas essa autonomia
não pode ser confundida com o individualismo como prega o discurso neoliberal,
sugerindo como ideia de democracia a liberdade de iniciativa dos indivíduos.
Por outro lado, na perspectiva de uma gestão democrática, a definição de
autonomia deve estar fundamentada nos princípios da escola cidadã, de acordo
com o que afirma Padilha[5]:
A
autonomia pressupõe, pois, a alteridade, a participação, a liberdade de
expressão, o trabalho coletivo na sala de aula, na sala dos professores, na
escola e fora dela. A educação enquanto processo de conscientização
(desalienação) tem tudo a ver com a própria autonomia e, como esta, se
fundamenta no pluralismo político pedagógico, garante a mudança possível no
próprio sistema educacional e nos próprios elementos que o integram (2007, p.
65‐
66).
Nesse modelo de gestão, é imprescindível
o trabalho em equipe, uma equipe que tenha algumas competências, como:
capacidade de comunicação e expressão oral, habilidades de trabalhar em grupo,
capacidade de argumentação, formas criativas de enfrentar problemas e situações
difíceis (LIBANEO, 2004, p. 103).
Dessa forma a gestão democrática da
escola, princípio para a construção do projeto político pedagógico, implica em
refletir sobre as políticas educacionais, isso requer mudanças nas estruturas
organizacionais e de paradigmas rumo à construção de uma gestão diferente da
que vemos hoje. Esse processo deve ser e é conduzido segundo uma determinada concepção
de educação e de sociedade, sendo assim, as escolas precisam ter clareza sobre:
Qual a ideia de sociedade na qual está fundamentada? Qual a ideia de escola
cidadã? Essa escola está fundamentada na gestão democrática, cujos fundamentos
são autonomia, participação e emancipação?
Na perspectiva de gestão democrática, “o
poder está no todo e é feito de processos dinâmicos construídos coletivamente,
mas não é um espaço desorganizado, sem objetivos, sem estratégias e sem
direção”. “Pois a gestão democrática é um processo de coordenação de iguais,
não de subordinados, portanto, escolher um diretor é escolher os rumos e a
qualidade de processos de gestão da escola” (BORDIGNON & GRACINDO, 2004, p.
148). Nesse contexto, o projeto político pedagógico se apresenta como
instrumento de luta e não como uma receita mágica para resolver todos os
problemas da escola. A autonomia, apesar de instituída na LDB, deve ultrapassar
os limites oficiais e ser construída a partir do PPP. A autonomia da escola,
não pode ser encarada como algo herdado ou adquirido, deve ser construída. Não
se esgota em decretos, mas avança a partir das aberturas que a legislação
apresenta.
Na década de 1990, as propostas de
descentralização e autonomia da escola foram postas em ação por meio de políticas
públicas e de iniciativas dos acordos entre o Banco Mundial (BIRD) e o governo
brasileiro. Nesse contexto tem início as discussões sobre o Plano Nacional da
Educação (PNE). Todos esses documentos que regem a educação brasileira
(Constituição, LDB, PNE) são resultados de conquistas da sociedade civil
organizada, e são referências para a elaboração dos Planos Estaduais e
Municipais de Educação. Na relação entre as Leis e o projeto político pedagógico
é importante destacar as influências dos dispositivos legais no processo de
significação político e pedagógico das escolas.
A gestão democrática do ensino público é
instituída por meio do reconhecimento da função política da educação e isso se
dá frente aos rumos da sociedade na luta pela democratização do país. A
Conferência Mundial sobre Educação para Todos, realizada na Tailândia (1990), é
o marco da nova posição de realinhamento do Estado brasileiro com as reformas
neoliberais. O Banco Mundial assume posição expressiva no financiamento da
educação básica. O fortalecimento da gestão e a ampliação da autonomia foram
destacados como “direção prioritária” da política educacional.
Como vemos um dos mais importantes
princípios da gestão democrática é o da autonomia, que não pode ser confundida
com o individualismo, como prega o discurso neoliberal. Na perspectiva de uma
gestão democrática, a definição de autonomia deve estar fundamentada nos
princípios da escola cidadã. Sendo assim, a gestão democrática da escola,
princípio para a construção do projeto político pedagógico, implica em refletir
sobre as políticas educacionais, processo que deve ser conduzido segundo uma
determinada concepção de educação e de sociedade. Ou seja, a autonomia da
escola deve ser construída e o projeto político pedagógico
visto como instrumento de luta.
Rio
de Janeiro, 13 de junho de 2016.
[1] O Consenso de Washington foi um encontro ocorrido na
capital dos Estados Unidos, no ano de 1989. Foram convocados, diversos
economistas latino-americanos liberais, funcionários do Fundo Monetário
Internacional (FMI), Banco Mundial, Banco Interamericano de Desenvolvimento
(BID) e do governo norte-americano. O encontro buscava avaliar as reformas
econômicas na América Latina. As conclusões do encontro formam um conjunto
de medidas para promover o ajustamento macroeconômico dos países em
desenvolvimento.
[2] A Conferência realizada na cidade de Jomtien, teve como objetivo estabelecer compromissos mundiais para garantir a todas as pessoas os conhecimentos básicos necessários a uma vida digna, condição insubstituível para o advento de uma sociedade mais humana e mais justa. Participaram das discussões a UNESCO e a UNICEF, com apoio do Banco Mundial e de várias outras organizações intergovernamentais, regionais e organizações não governamentais.
[3] Documento
elaborado em 1993 pelo Ministério da Educação (MEC) destinado a cumprir, no
período de uma década (1993 a 2003), as resoluções da Conferência Mundial de
Educação Para Todos, realizada em Jomtien, na Tailândia, em 1990, pela Unesco,
Unicef, PNUD e Banco Mundial. Esse documento é considerado “um conjunto de diretrizes
políticas voltado para a recuperação da escola fundamental no país”.
[4] CUNHA, L. A. A
Educação na Nova Constituição. Revista da Associação Nacional de Educação –
ANDE, Ano 6, nº 12, p. 5-10, 1987.
[5] PADILHA, Paulo Roberto. Planejamento dialógico: como construir o
projeto político pedagógico. 7ª Ed. São Paulo, 2007.
[i] Professor, Especialista em Educação e Poeta.
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